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sábado, 23 de abril de 2011

Recado aos jovens pais

AOS JOVENS PAIS

De todas as virtudes de que o Cristo nos deixou o adorável exemplo, nenhuma foi mais indignadamente esquecida pela triste humanidade quanto a castidade. E não falo apenas da castidade do corpo, de que certamente ainda se encontrariam numerosos exemplos, mas dessa castidade da alma, que jamais concebeu um pensamento, deixou escapar uma palavra de natureza a infamar a pureza da virgem ou da criança que a escuta.
O mal é tão universal, as ocasiões de perigo tão multiplicadas, que os pais, mesmo os mais verdadeiramente castos em seus atos, como em suas palavras, não podem escapar à dolorosa certeza que seus filhos não poderão, façam o que fizerem, subtrair-se ao funesto contágio. É-lhes necessário, por maior que seja a repugnância por isto experimentada, resignar-se a abrir os olhos destas inocentes criaturas, ao menos para as preservar do perigo físico, pois é absolutamente impossível os preservar do perigo moral. E, muitas vezes ainda, quando julgarem ter desviado o perigo, verifica-se que o escolho, cuja existência não haviam suspeitado e sobre o qual vem arrebentar-se a pobre e inocente criança, que seu amor não pôde preservar da sujeira do vício.
Quantas palavras imprudentes, mesmo na mais escolhida sociedade; quantas imagens e descrições, mesmo nos mais sérios livros, não vêm, sem que os pais o saibam, despertar, excitar e, até, satisfazer completamente essa curiosidade ávida, tão temível, da criança que não tem consciência do perigo! Se o mal é difícil de evitar, mesmo nas classes mais esclarecidas da sociedade, que dizer das classes inferiores? Supondo que uma criança atenha tido a felicidade de escapar a isso no lar, como a garantir desse inevitável contato com os vícios que a acotovelam diariamente?
Eis uma chaga muito profunda e perigosa, e da qual todo homem, que conservou o senso moral no fundo do coração, deve sentir a mais imperiosa necessidade de expurgar da sociedade. O mal está arraigado em nossos corações, e muito tempo se escoará ainda antes que cada um de nós se tenha tornado suficientemente puro para apenas lhe suspeitar a gravidade. Tal pensaria cometer uma falta séria se, ante uma criança, se permitisse a menor palavra de duplo sentido mas, se rodeado por pessoas maduras, sentirá um prazer nas piadas obscenas ou triviais que, fiz ele, não fazem mal a ninguém. Ele não vê que a obscenidade é um mal tão imoral que mancha tudo o que toca, mesmo o ar, cujas vibrações levarão longe o contágio. Diz-se que as paredes têm ouvidos e esta imagem foi sempre verdadeira, sobretudo em semelhante matéria. A pura e santa castidade só estabelecerá definitivamente seu reino na Terra quando toda criatura que pensa e fala tiver compreendido que jamais deve, em qualquer circunstância, nem escrever nem pronunciar uma palavra que a virgem mais pura não possa ouvir sem corar.
Direis que não tendes filhos e que não há uma só criança em vossa casa e, assim, não tendes nenhuma razão, no vosso entender, para vos constrangerdes. Mas se vós mesmos fôsseis puros, não seríeis constrangidos. Não tendes amigos que vos escutam, que o vosso exemplo excita e que, ante os filhos que não conheceis, poderão perder a reserva que um resto de pudor lhes havia feito observar até então? Depois, é quase sempre às refeições que vosso espírito se deixa arrastar em tiradas que provocam o riso dos convivas; mas não vedes os criados que vos rodeiam e que o vizinho tem filhos! Não conheceis esse vizinho nem seus filhos e jamais sabereis o mal de que fostes causa. Mas o mal, venha de onde vier, será sempre punido, ficai certos. Não só as paredes têm ouvidos: há no ar que respirais coisas que ainda não conheceis ou que não quereis conhecer.
Ninguém tem o direito de exigir de seus subalternos uma virtude que não pratica nem possui.
Uma única palavra impura basta para alterar a pureza de uma criança; uma única criança impura introduzida numa casa de educação pública basta para grangrenar toda uma geração de crianças que, mais tarde, tornar-se-ão homens. Há um só homem sensato que ponha em dúvida a verdade patente e dolorosa deste fato? Ninguém duvida, ninguém ignora toda a extensão do mal que uma só palavra pode ocasionar e, contudo, ninguém se julga obrigado a essa castidade da alma que revolta todo pensamento obsceno, por mais disfarçado que seja e, mesmo, em certas circunstâncias, ninguém olha como estrita obrigação moral abster-se de pilhérias que deviam fazê-lo corar, se não sentisse orgulho em não corar. Triste e vergonhoso orgulho!
Não é só a castidade que deveríamos respeitar nas crianças: é também essa delicada conduta a quem toda idéia de falsidade faz subir o sangue ao rosto. E esta virtude é também muito rara. Mas quando se observa como é elevada a imensa maioria de nossos filhos, não nos devemos admirar muito. Para a maioria dos pais, os filhos, sobretudo em tenra idade, quase que não passam de bonequinhas, com as quais se divertem, como se com um brinquedo. E o que as torna tão divertidas é que sua ingênua credulidade permite enganá-las de manhã à noite com pequenas mentiras, julgadas inocentes porque são feitas sem qualquer maldade e unicamente para rir, como se diz. Ora, em sua verdadeira acepção, inocente significa que não prejudica. Mas, que há de mais nocivo, ao contrário, à candura de uma criança, que esses pequenos abusos de confiança incessantes, de que é última um instante, mas um instante só, do qual se ri e depois se diverte e que acha o maior prazer em imitar logo que pode?
Disso resulta muitas vezes que a criança mais cândida aprende a enganar tão depressa quanto aprende a falar e que, ao cabo de pouco tempo, é capaz de dar lições aos seus mestres.
Quase que não se suspeita quanto, sobretudo nessa idade, por vezes uma causa insignificante pode, mais tarde, dar lugar a deploráveis resultados. Os órgãos da inteligência, nas crianças muito jovens, são como cera mole, apta a receber a moldagem do mais fraco objeto que a toca; e, mesmo por um instante, a deformação. E quando esta cera, a princípio tão fluida, vier a endurecer, a impressão ficará inapagável. Pode crer-se que seja coberta por outras, mas é um erro: só a marca primitiva ficará indelével e, ao contrário, as outras impressões ulteriores é que deixarão um traço fugidio, sob o qual a primeira aparecerá sempre.
Eis o que bem poucos jovens pais são capazes de sentir com bastante força para o constituir em regra de conduta com os filhos, e o que lhes é necessário repetir continuamente. (Espírito de Cécile Monvel - R. E.
1863)

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